9 de fevereiro de 2012

Ninguém aguenta ser massa...

Tom Zé no Trama / Radiola - Arquivo

"A faixa esmagada vive bem, mas se sente brutalizada por que ninguém é gente.
Ninguém aguenta ser massa!"

Ontem a noite tive o prazer de participar de uma roda de conversa com Gustavo Taretto, o diretor Argentino de Medianeras (um dos filmes que considero dos melhores de 2011, muito recomendo). O filme trata do Amor em Buenos Aires na era virtual, onde dois jovens que moram na mesma rua não se encontram. Como muitas outras obras do invejável cinema Argentino, trata de coisas simples do cotidiano e dessa forma atinge profundamente as pessoas que estão sonhando aquele sonho coletivo na sala do cinema.

Respondendo a uma das últimas perguntas, que tratava do porque os Europeus invejam tanto a criatividade do cinema Latino Americano, ele disse mais ou mens o seguinte: "Na Europa tudo funciona, esse aburguesamento estraga a criatividade. Na América Latina nada funciona direito, você para conseguir viver, tem de ser muito criativo, pois aqui a vida é muito imprevisível. Já na Europa é tudo muito previsível".

Então matutando algumas reflexões, conclui que talvez, devido a intensa imprevisibilidade da vida aqui (desempregos, crises, pobreza, transporte, enchentes, ...) é que haja tanta esperança e fé. Pois há uma constante crença de que as coisas vão acontecer e que vão dar certo (são poucos os que realmente desacreditam, são tachados de pessimistas). E esse acreditar fortalece e move as pessoas, fazendo com que de modo criativo e com escassos recursos, se ajuntando, se ajudando (em especial nas comunidades mais pobres), elas fazem as coisas acontecer, fazem ser possível sua realização. Essa coisa de estar sempre em crise (e não se iludam com a economia, a miséria continua a existir nas esquinas Brasileiras) fortalece muito o fazer e a forma de fazer na América Latina. E mais, acho que a forma caótica de sobrevivermos (em função da imprevisibilidade) é que nos faz crescer, aprender e evoluir tanto (aos que percebem e se abrem pra isso obviamente, que se permitem), pois é sabido que por mais doloridos e temidos, são os momentos de crise que nos fazem refletir profundamente, sair do estado mecânico e alienante, se forçando a recriar caminhos, escolhas, planos e ações.

Por isso, tive um certo repúdio quando no final do ano passado o Guido Mantega afirmou que "serão necessários até 20 anos para que os brasileiros tenham um padrão de vida semelhante ao dos europeus", pois não quero um padrão de vida semelhante ao Europeu. Quero ao contrário, fortalecer cada vez mais um modo Latino de vida digna (e que o Brasil se vire de frente para a América Latina finalmente...), que não me deixe ser alienado porque tudo funciona e dá certo. Nossa vida ainda precisa de muita Tropicália. Tom Zé que o diga...

3 comentários:

  1. como Galeano disse a Utopia que move a gente e permite que continuemos a caminhar, com fé e esperança, olhando sempre para o horizonte.

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  2. Texto interessante, Toninho! Referências muitoooo boas! "Ninguém aguenta ser massa"... Vou ficar com isso bastante tempo na cabeça...!

    Muitas coisas para refletir nisso que você escreveu, Toninho! Por exemplo: será que o povo europeu tem menos fé e esperança? E se a resposta for sim, será que o motivo é o fato de aparentemente "tudo dar certo"???

    Outro exemplo: a imprevisibilidade e as dificuldades rotineiras de algumas cidades grandes brasileiras parecem mesmo exigir certa criatividade e jogo de cintura do povo, moldando, talvez, esse jeitinho mais conversador, inovador, esperançoso! Mas nem sempre a adversidade é um ingrediente para que as pessoas se ajudem (ainda não é, infelizmente)... A gente ouve relatos diários de atrocidades e crimes contra a dignidade humana por motivos tão banais... Brigas de vizinho, som alto, ou, simplesmente, um não foi com a cara do outro (há tanto e tanto disso com o público que trabalho, por exemplo... Muito triste).
    Mas são apenas reflexões para aguçar ainda mais esses seus dizeres interessantes!
    Beijos, querido
    Carol

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  3. Carol,

    Do pouco que pude sentir deles, acho que tem menos fé e menos esperança, em especial do que os povos mais pobres em geral. Não sei se somente pelo fato de que tudo funciona, mas acho que esse é um dos principais motivos.

    Siim, com certeza, em especial neste momento de transição, em que tudo fica mais a flor da pele né?

    Beijão

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